Democracia, Educação ou Saúde. Como Famílias Empresárias estão fazendo os seus investimentos sociais?

Por Beatriz Johannpeter - Consultora Associada da Cambridge Family Enterprise Group Brasil e membro da Família Gerdau Johannpeter


Todos queremos democracia, educação de qualidade e um bom serviço de saúde pública para dar conta das demandas sociais brasileiras, sendo elas emergenciais ou permanentes.

Doações significativas de recursos privados para amenizar a disseminação e evitar o colapso dos serviços de públicos de saúde estão sendo realizados com agilidade. Esta é uma crise sanitária global com efeitos drásticos na saúde e com efeitos colaterais na economia e na educação, reforçando ainda mais os desafios das desigualdades sociais.

Como a sociedade e os recursos privados estão contribuindo com as necessidades emergenciais? Como fazer as melhores decisões para endereçar os investimentos para os mais vulneráveis? O que a crise revela sobre o papel das empresas familiares na sociedade?

Diversas doações e ações de captação coletiva estão sendo realizadas no Brasil. Elas têm o objetivo de apoiar os investimentos em instalações e equipamentos hospitalares imprescindíveis para suprir a demanda de pico que estamos tendo principalmente em centros urbanos.

Corporações tem como sua principal responsabilidade social garantir compromissos com Stakeholders. Mas algumas grandes empresas de controle familiar como Ambev+Gerdau, Magazine Luiza, Suzano, Votorantim, Grupo Zaffari, foram além e rapidamente realizaram doações em valores superiores a R$10 milhões especificamente em função do novo Coronavírus. Conforme dados divulgados pelo Monitor das Doações COVID-19, consolidado pela ABCR (Associação Brasileira de Captadores de Recursos), o montante total doado até o momento é de mais de R$ 3 bilhões. Estes montantes atualizados instantaneamente no site, são fortemente liderados pelos bancos, que representam 72% das doações. Holdings e filantropia familiar somadas representam 4%. O Itaú Unibanco recentemente anunciou um investimento complementar somando R$ 1 bilhão (3,6% do lucro líquido) voltado principalmente para as demandas emergenciais do SUS (Sistema Único de Saúde) e campanhas de conscientização da população. Ainda assim, vale a pena salientar que todas estas organizações mantêm suas doações regulares de Investimento Social em suas comunidades vizinhas através de seus Institutos e Fundações. Outras empresas familiares contribuíram não só com recursos financeiros, mas cedendo maquinário para confecção de uniformes e máscaras, produção de álcool gel e reparo de respiradores. Doações de produtos de limpeza, alimentação e EPIs também fizeram parte da responsabilidade social emergencial de muitas empresas.

Iniciativas que congregam também doações relevantes de famílias empresárias e pessoas físicas foram estruturadas por organizações consagradas do terceiro setor. O Fundo Emergencial para a Saúde instituído pelo IDIS, Movimento Bem Maior e BSocial com apoio de GIFE, Synergos e tantos outros, assim como Comunitas foram muito ágeis para mobilizar recursos financeiros e investir em leitos de UTIs, aquisição de respiradores e equipamentos necessários para fortalecer os serviços públicos de saúde e evitar o colapso conforme experiência de diversos países. Outras iniciativas como Enfrente, que oferece o mecanismo de matching oferecido pela Fundação Tide Setubal ou Movimento Família Apoia Família, foram também estruturados via crowdfunding especificamente para apoiar as demandas emergenciais de saúde. Crowdfunding feito via sites como Benfeitoria, Vakinha e Catarse que atendem um número enorme de iniciativas diversas e pulverizadas em todo território nacional.

Me parece ser sem precedentes a forma como a população em geral, independente da geografia, classe social e atividade profissional, está mobilizada e engajada. Cidadãos e OSCs (Organizações da Sociedade Civil) estão se articulando voluntariamente para doar alimentos e produtos de higiene para quem mais precisa. Algumas iniciativas mais ligadas as comunidades de periferia, com a situação da crise tiveram que inovar. Por exemplo, o “Corona no Paredão” do Gerando Falcões, desenvolveu cartões digitais para distribuir para famílias de baixa renda e assim receber cestas doadas sem causar problemas epidemiológicos e logísticos de distribuição e ainda oportunizarem compras no comercio local. Estamos todos mobilizados, por estarmos também nos sentindo mais vulneráveis e com uma insegurança generalizada. Passamos a pensar mais nas fragilidades de todos e estamos mais empáticos. Este processo, nos leva para um novo nível de consciência onde aprenderemos a agradecer mais o que temos e passaremos a repensar nossa forma de agir, de viver e de nos relacionar.

A partir da superação dos desafios financeiros em função da crise e da preservação do patrimônio, potencializar o sucesso de uma família empresária é a melhor receita para buscar longevidade geracional. Famílias que tem em seus valores, o compromisso do give back, para ajudar o próximo, apoiar a construção de uma sociedade melhor e serem guardiões de suas comunidades, fortalecem os seus laços. Famílias empresárias, controladoras de grandes empresas assim como empresas familiares menores tem desempenhado um importante papel no seu compromisso social e na mobilização de recursos emergências para dar conta dos desafios da crise. Mas qual o papel do Investimento Social Privado Familiar? Que diferença estes investimentos podem fazer nos desafios sociais que temos? Acredito que temos muito a aprender com o mindset dos mais jovens. A nova geração está em busca de soluções inovadoras para lidar com os desafios sociais de forma integrada e buscar a redução das desigualdades de oportunidades. Práticas como novas formas de mobilização e uso de tecnologias, monitoramento e avaliação dos projetos e dos investimentos direcionados para impacto são percebidas pelos jovens como imprescindíveis. O objetivo é ter um propósito claro mais voltado para os impactos sociais e a transformação que o investimento está proporcionando do que um simples assistencialismo para manutenção de estruturas existentes. Cabe também destacar o relevante incentivo que recursos de famílias, através de Family Offices tem oferecido para os Investimentos de Impacto. Estas startups sociais na área da saúde e da educação tem tido enorme prontidão para ajustar seus produtos e serviços para atender as demandas advindas da pandemia e do isolamento social necessário no momento. Será que estes negócios de Impacto com causas sociais podem atender a estas necessidades e ainda virem a ser negócios rentáveis?

Alocar conhecimento para que empreendedores de comunidades mais vulneráveis construam soluções de mercado que melhorem seu contexto pode ser um novo caminho.

Sabemos que precisamos de um sistema onde OSCs (ou ONGs) confiáveis e bem estruturadas, desempenhando seu papel em parceria com governos e sociedade civil, para fortalecer a democracia. Sabemos também que recursos privados são irrelevantes dentro de tantas demandas, mas estes podem fomentar novos caminhos mais digitais e sustentáveis. O volume de recursos mobilizados em torno dos desafios emergenciais da COVID-19 nos mostra que podemos incrementar os investimentos sociais, melhorar as políticas públicas e fortalecer a sociedade civil organizada. Esta precisa de financiamento privado para exercer o seu papel de controle social.

Esta crise mobilizou recursos privados para a melhoria dos serviços de saúde pública mas tende a deixar sequelas na economia e na educação nos levando para maiores desigualdades sociais. As decisões de cada governo e a forma como as empresas e os cidadãos vão lidar com os desafios serão decisivos para nossos rumos. Os duros aprendizados desta crise quem sabe nos direcionam para uma sociedade mais humana, com mais igualdade de oportunidades e menos desigualdades sociais.

Sobre Beatriz Johannpeter

Beatriz é Consultora Associada do Cambridge Family Enterprise Group. Ela atua como mentora de famílias empresárias, com aconselhamento e desenvolvimento de estruturas que impulsionam o aprimoramento de sistemas de governanças, para perpetuidade e construção de legado. Em sua atuação, reúne a experiência da família Gerdau Johannpeter, uma das famílias empresárias pioneiras em construção de governança no Brasil, e o conhecimento adquirido em constantes programas de educação executiva, como o Corporate Social Responsability, da Harvard Business School.

Formou-se em arquitetura e empreendeu na área até 2005, quando passou a dedicar-se inteiramente ao recém-criado Instituto Gerdau, responsável pela gestão do Investimento Social Privado (ISP) da empresa e da família. Desde então, participa das principais entidades e fóruns do Terceiro Setor, tendo presidido o Gife (Grupo de Institutos e Fundações) por dois mandatos (de 2014 a 2017).

Nesse período, Beatriz vem contribuindo com empresas e instituições nas áreas de ISP, Educação e Cultura, partir de posições em conselhos consultivos, como o do Canal Futura, da Fundação Victor Civita, da Bienal do Mercosul e da Junior Achievement Brasil. Atualmente, integra os conselhos da Fundação Roberto Marinho, da organização Todos pela Educação, da Fundação Iberê Camargo e da Arcah.

Editorias: Educação  Negócios  Terceiro Setor  
Tipo: Artigo  Data Publicação: 05/05/20
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